Os preconceitos do mundo sobre o que se convencionou
chamar "ponto de honra" produzem essa suscetibilidade sombria,
nascida do orgulho e da exaltação da personalidade, que leva o homem a
retribuir uma injúria com outra injúria, uma ofensa com outra, o que é tido
como justiça por aquele cujo senso moral não se acha acima do nível das paixões
terrenas. Por isso é que a lei moisaica prescrevia:
olho por olho, dente por dente, de harmonia com a época em que Moisés vivia.
Veio o Cristo e disse: Retribui o mal com o bem. E disse ainda: "Não
resistais ao mal que vos queiram fazer; se alguém vos bater numa face,
apresentai-lhe a outra.” Ao orgulhoso este ensino parecerá uma covardia,
porquanto ele não compreende que haja mais coragem em suportar um insulto do que em
tomar uma vingança, e não compreende, porque sua visão não pode ultrapassar o
presente.
Dever-se-á, entretanto, tomar ao pé da letra aquele
preceito? Tampouco quanto o outro que manda se arranque o olho, quando for
causa de escândalo. Levado o ensino às suas últimas conseqüências, importaria
ele em condenar toda repressão,
mesmo legal, e
deixar livre o campo aos maus, isentando-os de todo e qualquer motivo de temor.
Se se lhes não pusesse um freio as agressões,
bem depressa todos os bons seriam suas vítimas. O próprio instinto de
conservação, que é uma lei da Natureza, obsta a que alguém estenda o pescoço ao
assassino. Enunciando, pois, aquela máxima, não pretendeu Jesus interdizer toda
defesa, mas condenar a vingança. Dizendo que apresentemos a outra face àquele que nos haja batido numa, disse, sob
outra forma, que não se deve pagar o mal com o mal; que o homem deve aceitar
com humildade tudo
o que seja de molde a lhe abater o orgulho; que maior glória lhe advém de ser ofendido do que de
ofender, de suportar
pacientemente uma injustiça do que de praticar alguma; que mais vale ser enganado do que
enganador, arruinado
do que arruinar os outros. E, ao mesmo tempo, a condenação do duelo, que não
passa de uma manifestação de orgulho. Somente a fé na vida futura e na justiça
de Deus, que jamais deixa impune o mal, pode dar ao homem forças para suportar com paciência os
golpes que lhe sejam desferidos nos interesses e no amor-próprio. Daí vem o
repetirmos incessantemente: Lançai
para diante o olhar; quanto mais vos elevardes pelo pensamento, acima da vida
material, tanto menos vos magoarão as coisas da Terra.
O Evangelho Segundo o Espiritismo, capítulo 12 – Amai os Vossos Inimigos, item 8.